sábado, 22 de setembro de 2012

Ante a mediunidade


ANTE A MEDIUNIDADE

Convirá se procure convencer a um incrédulo obstinado? Já dissemos que isso depende das causas e da natureza da sua incredulidade. Muitas vezes, a insistência em querer persuadí-lo o leva a crer em sua importância pessoal, o que, a seu ver, constitui razão para ainda mais se obstinar. Com relação ao que se não convenceu pelo raciocínio, nem pelos fatos, a conclusão a tirar-se é que ainda lhe cumpre sofrer a prova da incredulidade. Deve-se  deixar à Providência o encargo de lhe preparar  circunstâncias mais favoráveis. Não faltam os que anseiam pelo recebimento da luz, para que se esteja a perder tempo com os que a repelem.
        Dirigi-vos, portanto, aos de boa-vontade, cujo número é maior do que se pensa, e o exemplo de suas conversões, multiplicando-se, mais do que simples palavras, vencerá as resistências. O verdadeiro espírita jamais deixará de fazer o bem. Lenir corações aflitos; consolar, acalmar desesperos, operar reforma morais, essa a sua missão. É nisso também que encontrará satisfação real. O Espiritismo anda no ar; difunde-se pela força mesma das coisas, porque torna felizes os que o professam. Quando o ouvirem repercutir em torno de si mesmos, entre seus próprios amigos, os que o combatem por sistema compreenderão o insulamento em que se acham e serão forçados a calar-se, ou a mudar-se. - Allan Kardec.
             (O Livro dos Médiuns, Cap. III, Do Método, item 30.)

        No trato da mediunidade, não andemos à cata de louros terrestres, nem mesmo esperemos pelo entendimento imediato das criaturas.
        Age e serve, ajuda e socorre sem recompensa.
        Recordemos Jesus e os fenômenos do espírito.
        Ainda criança, ele se  submete, no Templo, ao exame de homens doutos que lhe ouvem o verbo com imensa admiração, mas a atitude dos sábios não passa de êxtase improdutivo.
        João Batista, o amigo eleito para organizar-lhe os caminhos, depois de vê-lo nimbado de luz, em plena consagração messiânica, ante as vozes diretas do Plano Superior, envia mensageiros para lhe verificarem a idoneidade.
        Dos nazarenos que lhe desfrutam a convivência, apenas recebe zombaria e desprezo.
        Dos enfermos que lhe ouvem o sermão do monte, buscando tocá-lo, ansiosos, na expectativa da própria cura, não se destaca um só para segui-lo até à cruz.
        Dos setenta discípulos designados para misteres santificantes, não há lembrança de qualquer deles, na lealdade maior.
        Dos seguidores que comeram os pães multiplicados, ninguém surge perguntando pelo burilamento da alma.
        Dos numerosos doentes por ele reerguidos à bênção da saúde, nenhum aparece, nos instantes amargos, para testemunhar-lhe agradecimento.
        Nicodemos, que podia assimilar-lhe os princípios, procura-lhe a palavra, na sombra noturna, sem coragem de liberar-se dos preconceitos.
        Dos admiradores que o saúdam em regozijo, na entrada triunfal em Jerusalém, não emerge uma voz para defendê-lo das falsas acusações, perante a justiça.
        Judas, que lhe conhece a intimidade, não hesita em comprometer-lhe a obra, diante dos interesses inferiores.
        Somente aqueles que modificaram as próprias vidas foram capazes de refleti-lo, na glória do apostolado.
        Pedro, fraco, fez-se forte na fé, e, esquecendo a si mesmo, busca servi-lo até à morte.
        Maria de Magdala, tresmalhada na obsessão, recupera o próprio equilibrio e, apagando-se na humildade, converte-se em mensageira de esperança e ressurreição.
        Joana de Cusa, amolecida no conforto doméstico, olvida as conveniências humanas e acompanha-lhe os passos, sem vacilar no martírio.
        Paulo de Tarso, o perseguidor, aceita-lhe a palavra amorosa e estende-lhe a Boa Nova em suprema renúncia.
        Não detenha, assim, qualquer ilusão à frente dos fenômenos medianímicos.
        Encontrarás sempre, e por toda parte, muitas pessoas beneficiadas e crentes, como testemunhas convencidas e deslumbradas diante deles; mas, apenas aquelas que transfiguram a si mesmas, aperfeiçoando-se em bases de sacrifício pela felicidade dos outros, conseguem aproveitá-los no serviço constante em louvor do bem. - Emmanuel/Chico Xavier -
        (Do livro Seara dos Médiuns, lição: Ante a Mediunidade.)

MEDIUNIDADE E DEVER

         Entre os materialistas, importa distinguir duas classes: colocamos na primeira os que o são por sistema. Nesses, não há a dúvida, há a negação absoluta, raciocinada a seu modo. O homem, para eles, é simples máquina, que funciona enquanto está montada, que se desarranja e de que, após a morte, só resta a carcaça.
        Felizmente, são em número restrito e não formam escola abertamente confessada. Não precisamos insistir nos deploráveis efeitos que para a ordem social resultariam da vulgarização de semelhante doutrina. Já nos estendemos bastante sobre esse assunto em O Livro dos Espíritos (n. 147 e § III da Conclusão).
        Quando dissemos que a dúvida cessa nos incrédulos diante de uma explicação racional, excetuamos os materialistas extremados, os que negam a existência de qualquer força e de qualquer princípio inteligente fora da matéria. A maioria deles se obstina por orgulho na opinião que professa, entendendo que o amor-próprio lhes impõe persistir nela. E persistem, não obstante todas as provas em contrário, porque não querem ficar de baixo. Com tal gente, nada há que fazer; ninguém mesmo se deve deixar iludir pelo falso tom de sinceridade dos que dizem: fazei que eu veja, e acreditarei. Outros são mais francos e dizem sem rebuço: ainda que eu visse, não acreditaria.
       (O texto é de O Livro dos Médiuns, Capítulo III, Do Método.)

       - De que maneira o Espiritismo pode contribuir para o progresso?

       - Destruindo o materialismo, que é uma chaga da sociedade, ele faz os homens compreenderem onde está o seu verdadeiro interesse. A vida futura, não estando mais velada pela dúvida, o homem compreenderá melhor que ele pode assegurar seu futuro pelo presente. Destruindo os preconceitos de seitas, de castas e de cor, ele ensina aos homens a grande solidariedade que deve uni-los como irmãos. ( O Livro dos Espíritos, pergunta 799.)
 No campo da mediunidade, não olvides que o dever retamente cumprido é a bússola que te propiciará rumo certo.
       Deslumbrar-te-ás na contemplação de painéis assombrosos na esfera extra-física, mas, a fim de atendê-las honestamente,  a breve espaço sofrerás a espionagem das inteligências que pervagam nas trevas, a converterem-te as horas em pasto de vampirismo.
       Escutarás sublimes revelações, inacessíveis ao sensório comum; todavia, se não estiveres atento para com as ordenações da consciência laboriosa e tranqüila, em pouco tempo serás ouvido pelos agentes da sombra a enredarem-te os passos no fojo de perturbações aviltantes.
       Assimilarás o influxo mental de espíritos nobres, domiciliados além da Terra, e transmitir-lhes-ás a palavra construtiva em discursos admiráveis; contudo, se não demonstras reta conduta à frente dos outros, no exemplo vivo do trabalho e do entendimento, sem demora te encontrarás envolvido nas vibrações de criaturas retardadas e delinqüentes, a chumbarem-te os pés na fossa da obsessão.
       Psicografarás páginas brilhantes, nas quais a ciência e a fé se estampam, divinas; no entanto, se teus braços desertam do serviço santificante, transformar-te-ás facilmente no escriba da vaidade e da insensatez.
       Fornecerás importantes noticias do mundo espiritual, utilizando recursos ainda ignorados pela percepção dos teus ouvintes; entretanto, se foges do estudo que te faculta discernimento, serás para logo detido no nevoeiro da ignorância.
       Se a mediunidade evidente é tarefa que te assinala o roteiro, não te afastes dos compromissos que a vida te impõe.
       Sobretudo, lembra-te sempre de que o talento mediúnico, encerrado nas tuas mãos, deve ser a tela digna em que os mensageiros da Espiritualidade Maior possam criar as obras-primas da caridade e da educação, porquanto, de outro modo, se buscas comprazimento na indisciplina, do pano roto de tuas energias descontroladas surgirá simplesmente a caricatura das bênçãos que te propunhas veicular, debuxada pelos artistas do escárnio, que se valem da fantasia, a detrimento da luz. - Emmanuel/Chico Xavier.
(O texto é do livro: Religião dos Espíritos, lição: Mediunidade e dever) 

A FIGUEIRA E OS MÉDIUNS

        "Os médiuns são os intérpretes dos Espíritos; suprem, nestes últimos, a falta de órgãos materiais pelos quais transmitam suas instruções. Daí vem o serem dotados de faculdades para esse efeito. Nos tempos atuais, de renovação social, cabe-lhes uma missão especialíssima; são árvores destinadas a fornecer alimento espiritual a seus irmãos; multiplicam-se em número, para que abunde o alimento; há-os por toda parte, em todos os países, em todas as classes da sociedade, entre os ricos e pobres, entre os grandes e os pequenos, a fim de que em nunhum ponto faltem e a fim de ficar demonstrado aos homens que todos são chamados. Se, porém, eles desviam do objetivo providencial a preciosa faculdade que lhes foi concedida, se a empregam em coisas fúteis ou prejudiciais, se a põem a serviço dos interesses mundanos, se em vez de frutos sazonados dão maus frutos, se se recusam a utilizá-la em benefício dos outros, se nenhum proveito tiram dela para si mesmos, melhorando-se, são quais a figueira estéril. Deus lhes retirará um dom que se tornou inútil neles: a semente que não sabem fazer que frutifique, e consentirá que se tornem presas dos Espíritos maus."
        (O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XIX, item 10)

        "Dissemina a boa semente, edifica no Espírito Eterno, ergue o teu santuário interior para o Mestre e  atende às obrigações edificantes que te foram confiadas.
        É sempre fácil sorrir perante o céu azul e ensinar nos dias dourados, plenos de tranquilidade e de sol.
        É por isso que raros aprendizes sabem servir sob a noite tormentosa e ao longo das horas repletas de dores e dificuldades de toda sorte.
        A escola, entretanto, não é outra.
        Peçamos ao Divino Amigo nos conceda forças para negarmos a nós mesmos, olvidando quanto possa constituir remanescentes de nosso passado delituoso e energia para nos glorificarmos em nossa cruz de cada dia, talhada nos testemunhos de trabalho, a que fomos convocados na hora presente.
        Somente assim, meu irmão, poderemos seguir a Luz dos Nossos Destinos, transformando-nos em viva mensagem de seu Infinito Amor a benefício da Terra de paz e fraternidade com o Reino dos Céus, nos bem aventurados dias que virão."
                                              -  Emmanuel/Chico Xavier -
        (O texto é do livro:Luz no Caminho, página nº 61)

TAREFA MEDIÚNICA

      Mediunidade não é instrumento barato de mágica, com que os Espíritos Superiores adormeçam a mente dos amigos encarnados, utilizando-os em espetáculos indébitos para a curiosidade humana.
      Realmente observamos companheiros que se  confiam a entidades não aperfeiçoadas, embora inteligentes, efetuando o fascínio provisório de muitos, no setor das gratificações sentimentais menos construtivas, entretanto, aí temos o encantamento temporário e nada mais.
      Tarefa mediúnica, no fundo, é consagração do trabalhador ao ministério do bem. O fenômeno, dentro dela, surge em último lugar, porque, antes de tudo, representa caridade operante, fé ativa e devotamento ao próximo.
       Quem busca orientação para empresas dessa ordem, procure a companhia do Cristo que não vacilou em aceitar a cruz para servir, dentro do divino amor que lhe inflamava o coração.
       Ser medianeiro das forças elevadas que governam a vida é sintonizar-se com a onda sublime do Evangelho da Redenção que instituiu o "amemo-nos uns aos outros", como Jesus se dedicou a nós, em todos os dias da vida.
       A prosperidade dos sentidos superiores da alma não reside no artificialismo dos fenômenos transitórios e sim na devoção com que o discípulo da verdade se honra em peregrinar com o Mestre do perdão e da humildade, da renúncia e da vida eterna, ajudando, sem exceção, os viajores do escabroso caminho terrestre.
       Se pretendes, meu irmão, um título na mediunidade que manifesta no mundo as revelações do Senhor, não te fixes tão só na técnica fenomênica; rejubila-te com as oportunidades de servir, exprimindo boa vontade no socorro a todos os necessitados da senda humana , renovando os sofredores e os ignorantes, os perturbados e os tristes, sob o estandarte vivo de teu coração aberto para a Humanidade, abraça-os por tua própria família! Depois disso, guarda a convicção de que te movimentas para a frente e para o alto, porque Deus, o Compassivo Pai de todos nós, virá ao teu encontro, enchendo-te a jornada de esperança, alegria e luz.
         - Emmanuel/Chico Xavier, psicografada em 20 de março de 1950 -
                  (O texto é de o Reformador/Feb, junho de 1951). 

MÉDIUNS TRANSVIADOS

 Qual a causa do abandono do médium pelos Espíritos?

O uso que ele faz da sua faculdade, é o que mais influi sobre os bons Espíritos. Podemos abandoná-lo quando dela se serve para coisas frívolas ou objetivos ambiciosos; quando se recusa a transmitir nossa palavra ou nossos fatos aos encarnados que os pedem ou que têm necessidade de ver para se convencerem. Esse dom de Deus não é dado ao médium para que se divirta, e ainda menos para servir à sua ambição, mas para seu próprio melhoramento, e para fazer conhecer a verdade aos homens. Se o Espírito vê que o médium não responde mais aos seus objetivos e não aproveita as instruções e as advertências que lhe dá, se retira para procurar um protegido mais digno. 
“No que se refere aos médiuns abandonados a si próprios, imaginemos vontade nos instrumentos de que se vale o homem na sustentação do progresso.
A caneta nobre que se negasse a escrever, com medo de errar, terminaria, decerto, numa carroça de lixo, preterida por algum lápis humilde que prestasse concurso de boa vontade.
O automóvel distinto que desertasse do trabalho, com a desculpa de preservar-se contra a lama e a poeira, perderia o devotamento do motorista e seria desarticulado por mãos estranhas
O piano que intentasse desfigurar acordes e melodias afastaria a atenção do musicista, acabando disfarçado em prateleira obscura.
O martelo que se impusesse ao operário, revelando o propósito de menosprezar-lhe a cabeça, seria naturalmente largado à própria sorte, para cair talvez sob o domínio de algum criminoso vulgar.
Mediunidade é talento divino para edificar o consolo e a instrução entre os homens.
Os Espíritos benevolentes e sábios convidam as criaturas para colaborarem com eles na obra de esclarecimento e elevação da humanidade.
Os medianeiros que aderem, renascem no mundo com os característicos da instrumentação ideal.
Algumas vezes, no entanto, em plenitude das forças físicas, os tarefeiros do intercâmbio, enganados por transitórias facilidades, recusam-se ao compromisso assumido.
Instados pelos instrutores da Vida Maior, durante muito tempo, para que se desincumbam dos seus mandamentos, afirmam-se com receio da humilhação e da crítica, ou exploram situações, sequiosos de luxo e poder. Os benfeitores espirituais, por fim, renunciam à insistência construtiva, deixando-os entregues a si mesmos.
Então, semelhantes criaturas, que renasceram no corpo terrestre para a função da mediunidade  continuam médiuns, mas só a Lei de Deus sabe como.”
 Emmanuel/Chico Xavier  (O texto é do livro Seara dos Médiuns, lição: Médiuns Transviados).

MEDIUNIDADE E REFORMA ÍNTIMA

  Se o Espiritismo, conforme foi anunciado,  tem que determinar a transformação da Humanidade, claro é que esse efeito ele só poderá produzir melhorando as massas, o que se verificará gradualmente, pouco a pouco, em conseqüência do aperfeiçoamento dos indivíduos. Que importa crer na existência dos Espíritos, se essa crença não faz que aquele que a tem se torne melhor, mais  benigno e indulgente para com os seus semelhantes, mais humildes e pacientes na adversidade? Que serve ao avaro ser espírita,  se é sempre avaro; ao orgulhoso se ele é sempre pleno de si mesmo, ao invejoso se é sempre invejoso? Todos os homens poderiam, pois, acreditar nas manifestações, e a Humanidade ficar estacionária; mas tais não são os desígnios de Deus. É para esse fim providencial que devem tender todas as sociedades espíritas sérias, agrupando ao seu redor todos aqueles que estão  nos mesmos sentimentos; então, haverá entre elas união, simpatia, fraternidade, e não um vão e pueril antagonismo de amor-próprio, de palavras antes que de coisas; então, serão fortes e poderosos, porque se apoiarão sobre uma base inabalável: o bem para todos; então, elas serão respeitadas e imporão silêncio à tola zombaria, porque elas falarão em nome da moral evangélica respeitada por todos.
Tal é a senda na qual teremos nos esforçados para fazer entrar o Espiritismo. A bandeira que levantarmos bem alto é a do Espiritismo cristão e humanitário, ao redor da qual somos felizes em ver já tantos homens se congregarem sobre todos os pontos do globo, porque compreendem que aí está a âncora de salvação, a salvaguarda da ordem pública, o sinal de uma era nova para a Humanidade. Convidamos todas as sociedades espíritas a concorrerem para essa grande obra; que de um lado do mundo ao outro elas se estendam mão fraternal, e lançarão o mal em redes inextricáveis.
                         (O Livro dos Médiuns – Seg. Parte – Cap. XXIX)

 Existe diferença entre doutrinar e evangelizar?

- Há grande diversidade entre ambas as tarefas. Para doutrinar, basta o conhecimento intelectual dos postulados do Espiritismo; para evangelizar é  necessário a luz do amor no íntimo. Na primeira, bastarão a leitura e o conhecimento; na segunda, é preciso vibrar e sentir com o Cristo. Por estes motivos, o doutrinador muitas vezes não é senão o canal dos ensinamentos, mas o sincero evangelizador será sempre o reservatório da verdade, habilitado a servir às necessidades de outrem, sem privar-se da fortuna espiritual de si mesmo.
                          (O Consolador/Emmanuel e Chico Xavier).

Quando a espiritualidade sublime te clareou por dentro, passaste a  mentalizar  perfeição nas atitudes alheias. Entretanto, buscando, aqui e ali, padrões ideais de comportamento, nada mais recolheste que necessidades e negações.
Irmãos que te pareciam sustentáculos da coragem tombaram no desanimo, em dificuldades nascentes; criaturas que supunhas  destinadas à missão da bênção, pela música de carinho que lhes vibrava na boca, amaldiçoaram leves espinhos que lhes roçaram a vestimenta; companheiros que se afiguravam troncos na fé resvalaram facilmente nos atoleiros da dúvida, e almas que julgavas modelos de fidelidade e ternura abandonaram-te o clima de esperança, nas primeiras horas da luta incerta.
Sofres, exiges, indagas, desarvoras-te...
Trilhando o caminho da renovação que te eleva, solicitas circunstâncias e companhias em que te escores para seguir adiante; contudo, se estivesses no plano dos amigos perfeitos, não respirarias na escola do burilamento moral.
O Universo é governado por leis infalíveis.
“Daí e dar-se-vos-á” – ensinou Jesus.
Possuímos,  desse modo, tão-somente aquilo que damos.
Se aspiras a receber a simpatia e a abnegação do próximo, começa distribuindo simpatia e abnegação.
O entendimento na Doutrina Espírita esclarece-nos a cada um que  é loucura reclamar a santificação compulsória e, sim, que é dever simples de nossa parte operar a própria transformação para o bem, a fim de que sejamos para os outros, ainda hoje, o que desejamos sejam eles para nós amanhã.
É possível estejas atravessando a estrada longa da incompreensão, pedregosa e obscura.
Façamos, porém, suficiente luz no próprio íntimo, e a noite, por mais espessa, será sempre sombra a fugir de nós.
                                                                                          Emmanuel/Chico Xavier
                                   (Do livro Seara dos Médiuns, lição: Reforma íntima).

FUNÇÃO MEDIÚNICA

Estudo da questão 226 de O Livro dos Médiuns, Cap. XX
                                  O texto é do livro: Opinião Espírita/FCX


Mediunidade é igual ao trabalho: acessível a todos.
Entretanto, qual ocorre ao trabalho, é forçoso que o servidor dela seja leal ao próprio dever, para que a obra alcance os fins em vista.
O mais humilde dos utensílios tem qualidades polimórficas.
Qualquer médium também é suscetível de ser mobilizado, na produção de fenômenos múltiplos, favorecendo pesquisas e observações, com algum proveito, mas se quisermos rendimentos medianímico, seguro e incessante, na composição doutrinária do espiritismo, cada tarefeiro da mediunidade, embora pronto a colaborar, seja onde for, no levantamento do bem, é convidado  logicamente a consagrar-se à própria função, conquanto possua faculdades diversas, amando-a, estudando-a e praticando-a, no serviço ao próximo, que será sempre serviço a nós mesmos.
Se formos chamados a ensinar, através da palavra falada, aprimoremos a emoção e selecionemos a frase, para que os instrutores da Vida Maior nos utilizem o verbo, por agente de luz, construindo esclarecimento e consolação nos que nos ouvem; se designados a escrever, façamos em nós bastante silêncio interior, a fim de que a voz do mundo espiritual se manifeste por nossas mãos, instruindo a quem lê; se indicados ao labor curativo, sustentemos o magnetismo pessoal tão limpo quanto possível, para que os emissários celestes nos empreguem as energias no socorro aos doentes; se trazidos a cooperar na desobsessão, mantenhamos o pensamento liberto de idéias preconcebidas,  a fim de que os benfeitores desencarnados nos encontrem capazes da enfermagem precisa, no amparo aos companheiros desorientados e sofredores, sem criar-lhes problemas...
Mero ferrolho, deve estar no lugar próprio, para atender à serventia que se lhe roga dentro de casa.
Simples fio, para canalizar os préstimos da eletricidade, necessita ajustar-se à ligação correta, de modo a garantir a passagem da força.
Sobretudo, é imperioso recordar que todos podem ser medianeiros do bem, sob a inspiração de Jesus, honorificando encargos e responsabilidades, em posição certa, no plano de construção da felicidade geral. É por isso que ele, o Cristo de Deus, não nos disse que  maior no reino dos Céus será quem saiba fazer tudo, mas sim  aquele que se fizer o servo leal de todos.

M E D I U N I D A D E

Esmagadora maioria dos estudantes do Espiritismo situam na mediunidade a pedra basilar de todas as edificações doutrinárias, mas cometem o erro de considerar por médiuns tão-somente os trabalhadores da fé renovadora, com tarefas especiais, ou os doentes psíquicos que, por vezes, servem admiravelmente à esfera das manifestações fenomênicas.
Antes de tudo, é preciso compreender que tanto quanto o tato é o alicerce inicial de todos os sentidos, a intuição é a base de todas as percepções espirituais e, por isso mesmo, toda inteligência é médium das forças invisíveis que operam no setor de atividade regular em que se coloca.
Dos círculos mais baixos aos mais elevados da vida, existem entidades angélicas, humanas e sub-humanas, agindo através da inteligência encarnada, estimulando o progresso e divinizando experiências, brunindo caracteres ou sustentando abençoadas reparações, protegendo a natureza e garantindo as leis que nos governam.
Desvendando conhecimentos novos à Humanidade, o Espiritismo incorpora ao nosso patrimônio mental valiosas informações sobre a vida imperecível, indicando a nossa posição de espíritos imortais em temporário aprendizado, nas classes da raça, da nação e do grupo consangüíneo a que transitoriamente pertencemos na Terra.
Cada individualidade renasce em ligação com os centros de vida invisível do qual procede, e continuará, de modo geral, a ser instrumento do conjunto em que mantém suas concepções e seus pensamentos habituais. Se deseja, porém, aproveitar a contribuição que a escola sublime do mundo lhe oferece, em seus cursos diversos de preparação e aperfeiçoamento, aplicando-se à execução do bem, nos menores ângulos do caminho, adquirindo mais amplas provisões de amor e sabedoria, é aceita pelos grandes benfeitores do mundo, nos quadros da evolução humana, por intérprete da assistência divina, onde quer que se encontre, seja na construção do patrimônio de conforto material ou na santificação da alma eterna.
É necessário, contudo, reconhecer que, na esfera da mediunidade, cada servidor se reveste de características próprias.
O conteúdo sofrerá sempre a influenciação da forma e da condição do recipiente.
Essa é a lei do intercâmbio.
Uma taça não guardará a mesma quantidade de água, suscetível de ser sustentada numa caixa com capacidade para centenas de litros.
O perfume conservado no frasco de cristal puro não será o mesmo, quando transportado num vaso guarnecido de lodo.
O sábio não poderá tomar uma criança para confidente, embora a criança, invariavelmente, detenha consigo tesouros de pureza e simplicidade que o sábio desconhece.
Mediunidade, pois, para o serviço da revelação divina reclama estudo constante e devotamento ao bem para o indispensável enriquecimento de ciência e virtude.
A ignorância poderá produzir indiscutíveis e belos fenômenos, mas só a noção de responsabilidade, a consagração sistemática ao progresso de todos, a bondade e o conhecimento conseguem materializar na Terra os monumentos definitivos da felicidade humana. 

APOSTOLADO


Emmanuel e Chico Xavier

                                                        Livro: O Consolador

         Onde o maior escolho do apostolado mediúnico?

        - O primeiro inimigo do médium reside dentro dele mesmo. Frequentemente é o personalismo, é a ambição, a ignorância ou a rebeldia no voluntário desconhecimento dos seus deveres à luz do Evangelho, fatores de inferioridade moral que, não raro, o conduzem à invigilância, à leviandade e à confusão dos campos improdutivos.
        Contra esse inimigo é preciso movimentar as energias íntimas pelo estudo, pelo cultivo da humildade, pela boa vontade, com o melhor esforço de auto educação, à claridade do Evangelho.
        O segundo inimigo mais poderoso do apostolado mediúnico não reside no campo das atividades contrárias à expansão da Doutrina, mas no próprio seio das organizações espiritistas, constituindo-se daquele que se conveceu quanto aos fenômenos, sem se converter ao Evangelho pelo coração, trazendo para as fileiras do Consolador os seus caprichos pessoais, as suas paixões inferiores, tendências nocivas, opiniões cristalizadas no endurecimento do coração, sem reconhecer a realidade de suas deficências e a exiguidade dos seus cabedais íntimos. Habituados ao estacionamento, esses irmãos infelizes desdenham o esforço próprio - única estrada de edificação definitiva e sincera - para recorrerem aos Espíritos amigos nas menores dificuldades da vida, como se o apostolado mediúnico fosse uma cadeira de cartomante. Incapazes do trabalho interior pela edificação própria na fé e na confiança em Deus, dizem-se necessitados de conforto. Se desatendidos em seus caprichos inferiores e nas suas questões pessoais, estão sempre prontos para acusar e escarnecer. Falam da caridade, humilhando todos os princípios fraternos; não conhecem outro interesse além do que lhe lastreia o seu próprio egoísmo. São irônicos, acusadores e procedem quase sempre como crianças levianas e inquietas. Esses são também aqueles elementos da confusão, que não penetram o templo de Jesus e nem permitem a entrada de seus irmãos.
        Esse gênero de inimigos do apostolado mediúnico é muito comum e insistente nos seus processos de insinuação, sendo indispensável que o missionário do bem e da luz se resguarde na prece e na vigilância. E como a verdade deve sempre surgir no instante oportuno, para que o campo do apostolado não esterilize, faz-se imprescindível fugir deles.


CAPITULO XX

DA INFLUÊNCIA MORAL DO MEDIUM


Todas as imperfeições morais são outras tantas portas abertas ao acesso dos maus Espíritos. A que, porém, eles exploram com mais habilidade é o orgulho, porque é a que a criatura menos confessa a si mesma. O orgulho tem perdido muitos médiuns dotados das mais belas faculdades e que, se não fora essa imperfeição, teriam podido torna-se instrumentos notáveis e muito úteis, ao passo que, presas de Espíritos mentirosos, suas faculdades, depois de se haverem pervertido, aniquilaram-se e mais de um se viu humilhado por amaríssimas decepções.
O orgulho, nos médiuns, traduz-se por sinais inequívocos, a cujo respeito tanto mais necessário é se insista, quanto constitui uma das causas mais fortes de suspeição, no tocante à veracidade de suas comunicações. Começa por uma confiança cega nessas mesmas comunicações e na infalibilidade do Espírito que lhas dá. Daí um certo desdém por tudo que não venha deles: é que julgam ter o privilégio da verdade. O prestígio dos grandes nomes, com o que se adornam os Espíritos tidos por seus protetores, os deslumbra e, como neles o amor próprio sofreria, se houvessem de confessar que são ludibriados, repelem todo e qualquer conselho; evitam-nos mesmo, afastando-se de seus amigos e de quem quer que lhes possa abrir os olhos. Se condescendem em escutá-los, nenhum apreço lhes dão às opiniões, porquanto duvidar do Espírito que os assiste fora quase uma profanação. Aborrecem-se com a menor contradita, com uma simples observação crítica e vão às vezes ao ponto de tomar ódio às próprias pessoas que lhes tem prestado serviço. Por favorecerem a esse insulamento a que os arrastam os Espíritos que não querem contraditores, esses mesmos Espíritos se comprazem em lhes conservar as ilusões, par ao que os fazerm considerar coisas sublimes as mais polpudas absurdidades. Assim, confiança absoluta na superioridade do que obtêm, desprezo pelo que deles não venha, irrefletida importância dada aos grandes nomes, recusa de todo conselho, suspeição sobre qualquer crítica, afastamento dos que podem emitir opiniões desinteressadas: tais as características dos médium orgulhosos.
Devemos também convir em que, muitas vezes, o orgulho é despertado no médium pelos que o cercam. Se ele tem faculdades um pouco transcendentes, é procurado e gabado e entra a julgar-se indispensável. Logo toma ares de importância e desdém, quando presta a alguém o seu concurso. Mais de uma vez tivemos motivo de deplorar elogios que dispensamos a alguns médiuns, com o intuito de os animar.

Texto extraído do Livro dos Médiuns, Cap XX – Da Influência Moral do Médium - páginas 279 e 280.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Estudando a Mediunidade


1. Introdução

A mediunidade desempenha papel essencial no estabelecimento da base experimental da ciência espírita e nas atividades dos centros espíritas. Seu estudo sistemático e contínuo possibilita a correta compreensão tanto de sua natureza como de suas finalidades, habilitando-nos a dela obter seguros e produtivos resultados, com vistas ao nosso aperfeiçoamento intelectual e moral.

Esse estudo deve necessariamente estar centralizado no mais completo e profundo tratado que já se escreveu sobre a mediunidade: O Livro dos Médiuns, de Allan Kardec. Os presentes apontamentos devem ser tidos unicamente como uma exposição incompleta de alguns tópicos importantes, destinada a facilitar posteriores contatos com essa obra fundamental e a vasta literatura subsidiária surgida desde sua publicação, em 1861.

No Vocabulário Espírita que forma o capítulo 32 desse livro Kardec dá como sinônimos os termos mediunidade e medianimidade, definindo-os com "a faculdade dos médiuns". Quanto à palavra médium, Kardec explicita o seu significado em várias passagens de suas obras, como por exemplo nesse mesmo Vocabulário, onde se encontra esta definição sucinta:

MÉDIUM. (do latim, medium, meio, intermediário). Pessoa que pode servir de intermediário entre os Espíritos e os homens.

Ao analisar os conceitos de médium e de mediunidade, faz notar que a palavra médium comporta duas acepções distintas, expressas com clareza neste trecho da Revue Spirite:

Acepção ampla:

Qualquer pessoa apta a receber ou a transmitir comunicações dos Espíritos é, por isso mesmo, médium, quaisquer que sejam o modo empregado e o grau de desenvolvimento da faculdade, desde a simples influência oculta até à produção dos mais insólitos fenômenos.

Acepção restrita:

Em seu uso ordinário, todavia, esse termo tem uma aplicação mais restrita, aplicando-se às pessoas dotadas de um poder mediador suficientemente grande, seja para a produção de efeitos físicos, seja para transmitir o pensamento dos Espíritos pela escrita ou pela palavra.

Quando analisamos um texto ou um discurso onde o termo médium aparece, é importante reconhecer em qual desses sentidos está sendo empregado, a fim de se evitarem mal-entendidos e discussões sem fundamento. Assim, por exemplo, a afirmação feita no parágrafo 159 de O Livro dos Médiuns de que "todos [os homens] são quase médiuns" deverá ser entendida apenas na acepção ampla do termo, pois sabemos, pela questão 459 de O Livro dos Espíritos, que todos somos passíveis de receber a influência dos Espíritos, ainda que sob a forma sutil de intuição. Incorreremos em grave equívoco se concluirmos daí que todos somos mais ou menos médiuns no sentido restrito e usual da palavra, ou seja, se julgarmos que todos podemos produzir manifestações ostensivas, tais como a psicofonia, a psicografia, os efeitos físicos etc.

2. A natureza da mediunidade

Limitando-nos daqui para frente à acepção restrita do termo 'médium', que é a mais usual e relevante, estaremos, no que se vai seguir, entendendo a mediunidade como a aptidão especial que certas pessoas possuem para servir de meio de comunicação entre os Espíritos e os homens.

A questão que naturalmente surge neste ponto é a de se determinar qual é a natureza da faculdade mediúnica: quais as suas causas, por que surge somente em determinadas pessoas e em modalidades e graus diversos, se é passível de desenvolvimento forçado mediante alguma técnica etc.

Um aspecto central relativo à natureza da mediunidade acha-se exposto na resposta à questão que Kardec endereçou aos Espíritos no parágrafo 226 de O Livro dos Médiuns:

O desenvolvimento da mediunidade guarda proporção com o desenvolvimento moral dos médiuns?

"Não; a faculdade propriamente dita prende-se ao organismo; independe do moral. O mesmo, porém, não se dá com o seu uso, que pode ser bom ou mau, conforme as qualidades do médium."

Como observamos pela resposta dos Espíritos, a capacidade de servir de "ponte" entre o mundo espiritual e o mundo material está ligada a fatores de ordem orgânica. Esse ponto encontra-se exarado em vários lugares das obras de Kardec e de outros autores espíritas abalizados, passando, no entanto, despercebido à maioria das pessoas, mesmo espíritas.

Já em 1859 Kardec afirmava, em seu livro Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas que "essa faculdade depende de uma disposição orgânica especial, suscetível de desenvolvimento." Em O Livro dos Médiuns as referências nesse sentido são numerosas. No parágrafo 94, por exemplo, que trata das manifestações físicas espontâneas, os Espíritos informam que a aptidão de ser médium de efeitos físicos "se acha ligada a uma disposição física." Bem mais adiante, ao estudar a formação dos médiuns (§ 209), Kardec retorna ao assunto:

Têm-se visto pessoas inteiramentre incrédulas ficarem espantadas de escrever [mediunicamente] a seu mau grado, enquanto que crentes sinceros não o conseguem, o que prova que esta faculdade se prende a uma disposição orgânica.

Notemos que nesta última passagem há referência a mais um princípio importante: a mediunidade não depende das convicções filosóficas ou das crenças religiosas do médium.

Por fim, em resposta à questão 19 do parágrafo 223 desse mesmo livro os Espíritos esclarecem que "a mediunidade propriamente dita independe da inteligência bem como das qualidades morais" do médium. Portanto a mediunidade independe também do desenvolvimento intelectual do médium.

Resumindo o que vimos até aqui:

A mediunidade é a faculdade especial que certas pessoas possuem para servir de intermediárias entre os Espíritos e os homens. Ela tem origem orgânica, e independe:

da condição moral do médium;
de suas crenças;
de seu desenvolvimento intelectual.
No parágrafo 200 de O Livro dos Médiuns, Allan Kardec deixa claro que "não há senão um único meio de constatar [a existência da faculdade mediúnica em alguém]: a experimentação." Ou seja, só poderemos saber que uma pessoa é médium observando que efetivamente é capaz de servir de intermediário aos Espíritos desencarnados.

Isso naturalmente remete à importante questão do desenvolvimento da mediunidade. Por sua importância e pelas confusões e equívocos a que se tem prestado, merece ser abordada numa seção especial.

3. O desenvolvimento da mediunidade

Uma primeira observação a ser feita é que se a presença da faculdade mediúnica em uma pessoa independe de sua condição moral, intelectual e de crença, ninguém poderá tornar-se médium tão-somente pelo fato de moralizar-se, ou de estudar, ou de aderir às convicções espíritas. É evidente que essas atitudes serão de imenso proveito para a criatura, pois a colocarão em condições de compreender e utilizar bem a faculdade mediúnica que porventura possua.

É significativo, a esse respeito, que Kardec tenha alertado já no terceiro parágrafo da Introdução de O Livro dos Médiuns que muito se enganaria aquele que "supusesse encontrar nesta obra uma receita universal e infalível para formar médiuns." Lança mão, a seguir, de uma comparação muito clara e objetiva, que esclarece o assunto à saciedade (os destaques são nossos):

Se bem que cada um traga em si o gérmen das qualidades necessárias para se tornar médium, tais qualidades existem em graus muito diferentes e o seu desenvolvimento depende de causas que a ninguém é dado conseguir se verifiquem à vontade. As regras da poesia, da pintura e da música não fazem que se tornem poetas, pintores, ou músicos os que não têm o gênio de algumas dessas artes. Apenas guiam os que as cultivam no emprego de suas faculdades naturais. O mesmo sucede com o nosso trabalho. Seu objetivo consiste em indicar os meios de desenvolvimento da faculdade mediúnica, tanto quanto o permitam as disposições de cada um, e, sobretudo, dirigir-lhe o emprego de modo útil, quando ela exista.

O caráter espontâneo da faculdade mediúnica é ainda destacado no parágrafo 208 de O Livro dos Médiuns (o destaque é nosso):

Se os rudimentos da faculdade [mediúnica] não existem, nada fará que apareçam [...].

No capítulo intitulado "Manifestações dos Espíritos" de Obras Póstumas (parágrafo 6, no 34) encontramos esta densa passagem (destaque nosso):

O desenvolvimento da faculdade mediúnica depende da natureza mais ou menos expansível do perispírito do médium e da maior ou menor facilidade da sua assimilação pelo dos Espíritos; depende, portanto, do organismo e pode ser desenvolvida quando exista o princípio; não pode, porém, ser adquirida quando o princípio não exista.

E no parágrafo 198 de O Livro dos Médiuns, que trata da diversidade das faculdades mediúnicas, lemos ainda:

Em erro grave incorre quem queira forçar a todo custo o desenvolvimento de uma faculdade que não possua. Deve a pessoa cultivar todas aquelas de que reconheça possuir o gérmen. Procurar à força ter as outras é, antes de tudo, perder tempo, e, em segundo lugar, perder talvez, enfraquecer com certeza, as de que seja dotado.

Encerrando esse parágrafo, Kardec transcreve comunicação mediúnica de Sócrates sobre o desenvolvimento da mediunidade, que contém grave advertência:

Quando existe o princípio, o gérmen de uma faculdade, esta se manifesta sempre por sinais inequívocos. Limitando-se à sua especialidade, pode o médium tornar-se excelente e obter grandes e belas coisas; ocupando-se de tudo, nada de bom obterá. Notai, de passagem, que o desejo de ampliar indefinidamente o âmbito de suas faculdades é uma pretensão orgulhosa, que os Espíritos nuncam deixam impune. Os bons abandonam o presunçoso, que se torna então joguete dos mentirosos. Infelizmente, não é raro verem-se médiuns que, não contentes com os dons que receberam, aspiram, por amor-próprio ou ambição, a possuir faculdades excepcionais, capazes de os tornarem notados. Essa pretensão lhes tira a qualidade mais preciosa: a de médiuns seguros.

Apenas como exemplo de opinião de um outro autor, corroborativa da de Allan Kardec, vejamos como Emmanuel responde à questão 384 de seu livro O Consolador, questão essa que versa especificamente sobre o tema que estamos focalizando:

Dever-se-á provocar o desenvolvimento da mediunidade?

A mediunidade não deve ser fruto de precipitação nesse ou naquele setor da atividade doutrinária, porquanto, em tal assunto, toda a espontaneidade é indispensável, considerando-se que as tarefas mediúnicas são dirigidas pelos mentores do plano espiritual.

Logo em seguida, em resposta à questão 386, o conceituado Espírito reitera:

Ninguém deverá forçar o desenvolvimento dessa ou daqula faculdade, porque, nesse terreno, toda a espontaneidade é necessária; observando-se contudo, a floração mediúnica espontânea, nas expressões mais simples, deve-se aceitar o evento com as melhores disposições de trabalho e boa-vontade [...].

Precisamos portanto estar vigilantes quanto à opinião, infelizmente tão comum no meio espírita, de que as pessoas que aparecem nas casas espíritas devem, cedo ou tarde, ser encaminhadas às chamadas "sessões de desenvolvimento mediúnico". São dois os motivos mais freqüentemente alegados para esse tipo de recomendação: 1) o empenho e dedicação com que alguém se interesse pelo Espiritismo, sugerindo, segundo julgam, que tem "todas as condições" para exercer a mediunidade; 2) os desequilíbrios variados de saúde ou de comportamento que apresente, notadamente quando venham desafiando a perícia dos médicos.

Ora, no primeiro caso dever-se-ia ponderar que as boas disposições da pessoa deverão ser aproveitadas antes de mais nada em seu aperfeiçoamento intelectual e moral, e, em se tratando de sua colaboração nas atividades do centro espírita, naquele setor ao qual mais se ajuste por sua formação profissional, seus interesses e disponibilidades, quais sejam a condução de estudos, a evangelização infanto-juvenil, a administração, a biblioteca, as visitas fraternas, a costura de enxovais, a faxina, a distribuição de alimentos, a acolhida aos novos freqüentadores etc., ou os trabalhos mediúnicos, se os sinais de mediunidade se apresentarem de forma espontânea.

No segundo caso, que é o mais freqüente, seria preciso compreender que o mero fato de alguém encontrar-se desequilibrado significa que não pode ser inserido no grupo mediúnico, sob o risco de comprometer o seu bom funcionamento. A mediunidade em si é uma faculdade neutra, que não tem qualquer conexão com os desajustes físicos, mentais e espirituais da criatura. Estes surgem por motivos específicos, e requerem o tratamento médico, psicológico ou espírita adequado ao caso. Somente após seu retorno à normalidade é que a pessoa poderá participar, como médium, dos trabalhos mediúnicos, se a faculdade surgir espontaneamente. O exercício da mediunidade não é recomendável na presença de determinadas enfermidades físicas, como por exemplo, nas doenças contagiosas, ou onde o equilíbrio orgânico esteja "por um fio" e a atividade mediúnica envolva situações que emocionem muito o médium. No caso dos desequilíbrios mentais e espirituais, o exercício mediúnico não pode nunca ser iniciado, ou continuado. Um médium nessas condições não poderá contribuir positivamente, além de gerar dificuldades para o grupo, facilitando mesmo a atuação de Espíritos interessados na instalação da desarmonia, dos melindres, das suspeitas, do enregelamento das relações entre os membros.

O desenvolvimento mediúnico a ser promovido nos centros espíritas não deve nunca ser entendido como o aprendizado de técnicas e métodos para fazer surgir a mediunidade, pois que não os há nem pode haver, mas exclusivamente como o aprimoramento e direcionamento útil e equilibrado das faculdades surgidas de forma natural, o que pressupõe o aperfeiçoamento integral do médium, por meio do estudo sério e de seus esforços incessantes para amoldar suas ações às diretrizes evangélicas.

Ressaltemos, outrossim, que os núcleos espíritas não deverão iniciar qualquer trabalho mediúco, quer de desenvolvimento (no sentido correto do termo), quer, menos ainda, de assistência aos Espíritos enfermos, se não estiverem seguros de que dispõem de colaboradores suficientemente preparados, por seus conhecimentos doutrinários, por seu equilíbrio psicológico e por sua conduta cristã, que disponham de tempo para encetar com regularidade tão delicada tarefa.

Resumindo o que foi visto nesta seção:

A mediunidade é uma faculdade natural, que surge espontaneamente.
Não se deve procurar desenvolvê-la enquanto não aflorar por si só.
O desenvolvimento da mediunidade deve ser entendido unicamente como a sua educação, o seu aprimoramento, a sua disciplina, o seu direcionamento útil para o bem.
A mediunidade não é a causa primária dos desequilíbrios orgânicos e psicológicos.
O exercício da mediunidade não deve ser colocado como a culminação obrigatória das atividades do cooperador da casa espírita.

4. Os mecanismos da mediunidade

Na presente seção procuraremos reunir alguns informes sobre os mecanismos da faculdade mediúnica, ou seja, sobre como se dá o fenômeno mediúnico. A fonte básica continuará sendo Allan Kardec. Iniciemos com este trecho, já parcialmente transcrito, do capítulo "Manifestações dos Espíritos" de Obras Póstumas (§ 6, no 34; o destaque é nosso):

O fluido perispirítico é o agente de todos os fenômenos espíritas, que só se podem produzir pela ação recíproca dos fluidos que emitem o médium e o Espírito. O desenvolvimento da faculdade mediúnica depende da natureza mais ou menos expansível do perispírito do médium e da maior ou menor facilidade da sua assimilação pelo dos Espíritos.

Esmiuçando as informações aqui contidas, notamos:

O perispírito desempenha papel de capital importância no processo mediúnico.
Sendo o perispírito "o agente de todos os fenômenos espíritas", e estes só podendo produzir-se pela ação recíproca dos fluidos que emitem o médium e o Espírito, temos como regra sem exceções que, ocorrendo um fenômeno de comunicação com o mundo espiritual, necessariamente haverá a participação de um médium. Em alguns casos, como em certas manifestações de efeitos físicos, não se nota a presença do médium, mas podemos estar certos de que haverá alguém, em algum lugar, servindo de médium, ainda mesmo que este não esteja consciente do papel que desempenha. Também percebemos que serão vãos os esforços de certos pesquisadores que, desprezando a riquíssima contribuição do Espiritismo para o estudo daquilo que (impropriamente) denominam "paranormalidade", tentam detectar o Espírito unicamente por meio de aparelhos. Se algum instrumento chegar a registrar um espírito, é porque houve a participação oculta de algum médium. Neste caso, seria mais confiável analisar a manifestação diretamente, sem o recurso indireto de instrumentos, que sempre constituem fonte adicional de incertezas.
A presença da faculdade mediúnica em alguém liga-se à possibilidade de seu perispírito "expandir-se". Veremos logo mais que essa "expansão" do corpo espiritual pode ser entendida como a sua parcial desvinculação do corpo físico.
A efetivação da comunicação exige, além da "expansão" do perispírito do médium, a assimilação deste com o perispírito do Espírito comunicante, ou seja, tem de haver sintonia entre ambos. Esse fato importante, de que o médium em geral não é capaz de comunicar-se indiscriminadamente com todos os Espíritos, é exposto em Obras Póstumas imediatamente após o trecho que acabamos de transcrever (§ 6, no 35; os grifos são nossos):
As relações entre os Espíritos e os médiuns se estabelecem por meio dos respectivos perispíritos, dependendo a facilidade dessas relações do grau de afinidade existente entre os dois fluidos. Alguns há que se combinam facilmente, enquanto outros se repelem, donde se segue que não basta ser médium para que uma pessoa se comunique indistintamente com todos os Espíritos. Há médiuns que só com certos Espíritos podem comunicar-se ou com Espíritos de certas categorias, e outros que não o podem a não ser pela transmissão do pensamento, sem qualquer manifestação exterior.

No exame do assunto do item 3, podemos colher subsídios em André Luiz, o autor espiritual que tanto tem contribuído para a extensão de nosso conhecimento científico acerca da mediunidade. Em sua obra Evolução em Dois Mundos, ao analisar a fase evolutiva em que se elaborava a faculdade de desprendimento do veículo perispiritual durante o sono (capítulo 17, item "Mediunidade espontânea"), adianta esta valiosa informação (grifamos):

Consolidadas semelhantes relações com o Plano Espiritual [...], começaram na Terra os movimentos de mediunidade espontânea, porquanto os encarnados que demonstrassem capacidades mediúnicas mais evidentes, pela comunhão menos estreita entre as células do corpo físico e do corpo espiritual, em certas regiões do campo somático, passaram das observações durante o sono às da vigília, a princípio fragmentárias, mas acentuáveis com o tempo [...].

Vemos, assim, que o respeitado cientista deixa entrever a correlação íntima entre a possibilidade de contato com a realidade espiritual durante a vigília (mediunidade) e um certo "afrouxamento" das ligações entre as células do perispírito e as suas correspondentes do corpo material. Prosseguindo, André Luiz explicita mais essa correlação:

Quanto menos densos os elos de ligação entre os implementos físicos e espirituais, nos órgãos da visão, mais amplas as possibilidades na clarividência, prevalecendo as mesmas normas para a clariaudiência e modalidades outras, no intercâmbio entre as duas esferas [...].

Refletindo um pouco sobre as assertivas de André Luiz, verificamos, inicialmente, que não conflitam com a explicação dada por Kardec, em termos da capacidade de expansão do perispírito do médium. Há, pelo contrário, até um reforço, já que a noção de "expansão" é aqui suficientemente abrangente e flexível para permitir ulteriores elaborações e detalhamentos, dentro da natureza eminentemente progressiva do Espiritismo. Podemos compreender, deste modo, a "expansibilidade" do perispírito como a sua faculdade de desvinculação parcial e temporária do corpo físico, passando, nesse estado especial, a partilhar da realidade do mundo espiritual para nela colher impressões diversas, sem no entanto perder a possibilidade de atuação sobre o corpo denso.

É fundamental deixar claro que o que acabamos de expor não corrobora de modo algum a idéia popular de que no processo mediúnico o Espírito do médium "sai" e "dá lugar" ao Espírito comunicante, que passaria então a servir-se diretamente do corpo do médium. Os Instrutores Espirituais já esclareceram a Kardec, no importante capítulo "Do papel do médium nas comunicações espíritas" de O Livro dos Médiuns que essa idéia não corresponde à realidade. A mensagem sempre passa pelo Espírito do médium, mesmo quando ele não guarda disso a consciência ao despertar do transe. Vejamos o que dizem no item sexto do parágrafo 223:

O Espírito que se comunica por um médium transmite diretamente o seu pensamento, ou este tem por intermediário o Espírito do médium?

"É o Espírito do médium que é o intérprete, porque está ligado ao corpo que serve para falar e por ser necessária uma cadeia entre vós e os Espíritos que se comunicam, como é preciso um fio elétrico para comunicar à grande distância uma notícia e, na extremidade do fio, uma pessoa inteligente que a receba e transmita."

Compreendemos então que, em última instância, o comando do veículo físico só pode ser feito pelo seu próprio "dono". Poderíamos dizer que o corpo material é feito "sob medida" para cada Espírito, e que não "serve" para nenhum outro. O Espírito estranho não tem como agir diretamente sobre as células materiais formadas sob a influência de outro Espírito e para o seu próprio uso.

É interessante notar que nas questões seguintes à transcrita os Espíritos frisam mesmo enfrentando uma oposição inicial de Kardec que essa é uma regra absoluta, sem exceções, nem mesmo na mediunidade dita "mecânica", ou ainda nos casos de efeitos físicos onde uma mensagem inteligente é transmitida (tiptologia, escrita por meio de pranchetas etc). Vemos, na questão 10 do referido parágrafo, que os Espíritos expressam indiretamente sua desaprovação a esse modo de denominar a mediunidade na qual o médium não guarda consciência do conteúdo da cominicação: o médium jamais atua como máquina, mecanicamente.

Resumindo o conteúdo desta seção:

O perispírito desempenha papel essecial em todos os processos mediúnicos.
A faculdade mediúnica liga-se à possibilidade de o perispírito desvincular-se parcialmente do corpo físico durante a vigília.
A comunicação não se efetiva sem que haja sintonia entre os perispíritos do médium e do Espírito.
A comunicação espiritual, ainda que de efeitos físicos, sempre passa pelo Espírito do médium.

5. As modalidades mediúnicas

Um aspecto importante dos esclarecimentos de André Luiz é que permitem compreender não somente como se dá o fenômeno mediúnico, mas também o porquê da existência de diferentes modalidades de mediunidade. Observamos, pelos trechos citados, que a faculdade mediúnica será deste ou daquele tipo conforme a região do organismo em que as células do perispírito apresentem maiores possibilidades de desvinculação das que lhe correspondem no corpo físico. Desse modo, segundo o exemplo dado, se for nos órgãos da visão que ocorre a maior liberdade das células do perispírito, a mediunidade assumirá a forma de vidência; se nos órgãos da audição, a de audiência; se nos da fala, a de psicofonia, e assim por diante.

Devemos notar, no entanto, que os órgãos a que se refere André Luiz são, conforme se depreende de outras passagens de sua obra, não tanto os órgãos periféricos olhos, ouvidos, mãos etc. , mas fundamentalmente as regiões do cérebro responsáveis por seu comando. De fato, a ciência mostrou que há no cérebro grupos de neurônios (células nervosas) mais ou menos especializados para as diversas faculdades sensoriais e motoras. No caso da visão, por exemplo, tais neurônios recebem, através do nervo óptico, os impulsos elétricos gerados na retina do olho, sinais esses que a alma interpreta como imagens. O mesmo se dá, mutatis mutandis, com os demais sentidos. No caso das funções motoras, ao comando da alma determinados centros cerebrais enviam, através dos diferentes nervos, impulsos elétricos aos músculos, resultando daí os movimentos corporais.

Kardec dividiu os médiuns em duas grandes categorias: os de efeitos físicos e os de efeitos intelectuais. Os primeiros são "aqueles que têm o poder de provocar efeitos materiais, ou manifestações ostensivas"; os segundos, "os que são mais especialmente próprios a receber e a transmitir comunicações inteligentes" (O Livro dos Médiuns, parágrafo 187). Para fins didáticos, é conveniente subdividir a categoria de efeitos inteligentes em dois grupos: efeitos sensoriais (percepção da realidade espiritual na forma de uma impressão dos sentidos) e efeitos intelectuais propriamente ditos (transmissão de uma mensagem inteligente pela palavra escrita, oral, por gestos etc.).

Apresentaremos agora um quadro sinótico com os principais tipos de fenômenos mediúnicos, associados às diversas modalidades mediúnicas. Trata-se de uma adaptação do que foi elaborado por Jayme Cerviño em seu livro Além do Inconsciente, reunindo apenas as modalidades mais importantes. Nesse interessante e original livro, o autor infere, a partir de estudos clássicos da psicologia experimental e da neurofisiologia, bem como de investigações sobre os fenômenos espíritas, quais regiões do encéfalo estariam associadas às diferentes categorias de fenômenos espíritas.


6. O exercício da mediunidade

Na seção 2 deste trabalho vimos que se deve fazer uma distinção clara entre a mediunidade, enquanto faculdade, e o seu uso ou exercício. Se a faculdade em si é neutra, o mesmo não vale para o seu uso, que pode ser bom ou mau, dependendo da condição moral do médium.

Na Introdução de O Livro dos Médiuns Kardec destaca entre os objetivos da obra a orientação para que a mediunidade seja empregada de modo útil. Um requisito essencial para isso é a compreensão de sua natureza e mecanismos, no que o Espiritismo tem contribuído de forma decisiva. Respeitando a liberdade humana, ele não poderia prescrever normas de conduta para os médiuns de maneira cega, impositiva, sem um esclarecimento racional da sua necessidade. Éfacil constatar a justeza da afirmação de Kardec, nessa mesma Introdução, de que "as dificuldades e os desenganos com que muitos topam na prática do Espiritismo se originam na ignorância dos princípios desta ciência".

A preocupação com a compreensão e o exercício corretos da mediunidade vem sendo partilhada pelos espíritas sérios, que se conscientizaram da necessidade do crescimento espiritual do médium para que sua faculdade seja bem empregada. Muitos dos grandes autores espíritas dos dois planos da vida nos têm legado estudos e lições preciosas sobre a mediunidade e seu objetivo. Procuraremos, no que se vai seguir, compilar alguns desses ensinamentos.

Comecemos, no entanto, com O Livro dos Médiuns, em cujo parágrafo 226 Kardec pergunta aos Espíritos (no 3):

Os médiuns que fazem mau uso de suas faculdades, que não se servem delas para o bem, ou que não as aproveitam para se instruírem, sofrerão as conseqüências dessa falta?

"Se delas fizerem mau uso, serão punidos duplamente, porque têm um meio a mais de se esclarecerem e não o aproveitam. Aquele que vê claro e tropeça é mais censurável do que o cego que cai no fosso."

A questão da responsabilidade moral do uso da mediunidade é semelhante à das demais faculdades do homem. Aquele que emprega mal a inteligência, a palavra, os dotes artísticos ou a força física arcará com as conseqüências desse emprego, devendo expiar e reparar as faltas cometidas. No caso da mediunidade há um agravante, conforme se salienta na resposta dada, pois ela é poderoso recurso iluminativo.

É por meio da mediunidade que nos certificamos de nossa natureza imortal, fato de suma importância, em torno do qual gira todo o Espiritismo e sua doutrina moral. É ela que nos desvenda a vida futura, possibilitando-nos conhecer de modo abrangente os efeitos de nossas ações. Ajuizaremos então com mais acerto sobre o que nos convém ou não fazer, com vistas à nossa felicidade integral.

Para nós, os encarnados, a mediunidade constitui advertência contra o equívoco de tudo considerarmos do ponto de vista de nossos interesses materiais e imediatos, incentivando-nos a lutar contra o egoísmo, o embrutecimento dos prazeres, a estagnação do conhecimento.

Para os desencarnados sofredores, revoltados ou aturdidos, representa muitas vezes a via preferencial de despertamento, possibilitando-lhes retomar o progresso espiritual. A maioria das instituições espíritas em nosso país hoje em dia centraliza sua atuação mediúnica precisamente nessa tarefa, tão louvável pelos benefícios que espalha, mas também tão delicada em sua condução, exigindo muito preparo da equipe, quer no que concerne ao conhecimento doutrinário e à disciplina, quer quanto ao espírito fraterno e à devoção incondicional ao bem do próximo.

A esse respeito adverte Emmanuel no capítulo "Examinando a mediunidade" do livro Encontro Marcado:

O exercício da mediunidade nas tarefas espíritas exige larga disciplina mental, moral e física, assim como grande equilíbrio das emoções.

Na obra Educação e Vivência, lição "Mediunidade e problemas", o Espírito Camilo tece as seguintes considerações, ainda dentro desse tópico:

Tristemente, porém, muitas dessas criaturas que se sabem ou se imaginam médiuns não são bafejadas pelos recursos de amadurecido estudo, a fim de que compreendam o que é que se passa nesse vasto território dos fenômenos psíquicos.

Seria de esperar que os indivíduos que se embrenham pelos bosques das percepções mediúnicas fossem caindo em si, aprendendo que todos terão que dar conta desses talentos formidáveis que lhes são concedidos, nas experiências terrenas, na condição de empréstimo, proporcionando liberdade e ventura íntimas, logrando evadir-se dos tormentosos episódios do pretérito culposo ou negligente.

E em Cintilação das Estrelas (capítulo 32) esse lúcido Espírito prossegue no assunto:

Em mediunidade é importante que o médium se aplique em melhorar-se a si próprio, ampliando as percepções, iluminando-se a cada hora, nas lutas que deve enfrentar, na pauta do cotidiano.

O desenvolvimento da mediunidade marcha ladeando o desenvolvimento do médium. Quanto melhor o indivíduo, maior a sua fulgência mediúnica no bem.

Aprimore-se o homem para que se lhe ampliem as posições de sensibilidade mediúnica.

Têm-se infelizmente observado muitos agrupamentos mediúnicos descuidados quanto às superiores finalidades da mediunidade, bem como quanto às diretrizes doutrinárias que devem guiar sua prática. Não raro desenvolvem suas atividades de forma ritualística, tratando os médiuns como simples máquinas de comunicação. No momento do intercâmbio, os trabalhadores assumem posturas formais, como que denotando concentração e devoção ao bem, mas que nem sempre se fazem acompanhar das atitudes íntimas correspondentes. Manoel Philomeno de Miranda comentou esse tópico no capítulo intitulado "Mediunidade e viciação", do livro Sementeira da Fraternidade (p. 123):

O médium é filtro por cuja mente transitam as notícias da vida além-da-vida.

Nesse sentido, consideramos a concentração mental de modo diverso dos que a comparam a interruptor de fácil manejo que, acionado, oferece passagem à energia comunicante, sem mais cuidados... A concentração, por isso mesmo, deve ser um estado habitual da mente em Cristo, e não uma situação passageira junto ao Cristo.

Já analisamos na seção 3 a situação na qual o aparecimento da faculdade mediúnica se dá juntamente com desequilíbrios físico-espirituais variados, destacando o erro dos que consideram tais distúrbios como uma conseqüência da mediunidade em si. Em Educação e Vivência (p. 111), Camilo enfoca outro ângulo dessa questão:

A decantada "mediunidade de provas" não passa de episódio no qual alguém em provas e sérias expiações recebeu da Divina Misericórdia as excelênicas da sensibilidade mediúnica, através de cujas portas será chamado ou convocado à assunção de responsabilidades, bem como ao cumprimento dos deveres para com Deus, através do próximo.

Dessa forma a mediunidade, mesmo quando se apresente assinalada por impertinentes padecimentos dos médiuns, representa para eles a mão da Celeste Providência evitando dores maiores e tormentos mais acerbos.

A origem do nosso sofrimento, da nossa aflição, não reside na mediunidade, mas a bagagem de desacertos que ainda trazemos, acumulada nesta e em vidas pregressas. É por isso que nossos recursos mediúnicos, neutros em si memos, amiúde ainda se ligam aos mundos de sombra. Mal empregada, a mediunidade significará o cultivo da ignorância, a disseminação da dúvida e da mentira, o insuflamento do egoísmo e do orgulho, da vaidade e do personalismo, o verbo e o texto degradantes, a manipulação de forças mentais deletérias, a porta aberta às obsessões.

No capítulo 39 do livro Sementeira da Fraternidade, Vianna de Carvalho descreve a mediunidade como "canal cósmico por onde transitam seguras as consolações e esperanças para o atribulado espírito humano" (p. 179), destacando outro aspecto da mediunidade: o consolo que prodigaliza ao homem em sua vida de incertezas e de dores. Que de mais belo existe do que saber que o abismo que se imagina existir entre nós e os entes queridos que já partiram não é intransponível; que os sofrimentos que não conseguimos evitar têm causas justas ligadas ao nosso passado!...

Dádiva com que a misericórdia divina nos favorece, informando-nos de nossa natureza de seres imortais, a mediunidade bem empregada reveste as formas de esclarecimento acerca da vida além-túmulo, de consolo para os que perderam a esperança, de advertência salvadora para os equivocados, de amparo para os que cambaleiam, de recursos terapêuticos para os que enfermaram, de despertamento para os sofredores e os trânsfugas do dever que já cruzaram a aduana da morte. Daí a necessidade de desenvolvermos esse abençoado talento, nos trabalhos da caridade, nos exercícios constantes de benevolência para com todos, indulgência para com as imperfeições dos outros, de perdão das ofensas, conforme a questão 886 de O Livro dos Espíritos.

Reconheçamos, acima de tudo, que mais importante do que sermos bons médiuns, no que toca à faculdade, é sermos médiuns bons, a serviço de Jesus.

Referências bibliográficas

ANDRÉ LUIZ. Nos Domínios da Mediunidade. (Médium Francisco Cândido Xavier.) 13a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, 1955.
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CERVIÑO, J. Além do Inconsciente. 2a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, 1968.
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VIANNA DE CARVALHO. "Hipnose e mediunidade", in: Sementeira da Fraternidade. (Ditado por Espíritos diversos a Divaldo Pereira Franco.) 3a ed., Salvador, Livraria Espírita Alvorada Editora, 1979. Capítulo 39, pp. 177-81.
(Artigo publicado em Reformador de agosto de 1987, pp. 240-43 e 253-55.)

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Hábitos, Vícios e Mediunidade



 A mediunidade a serviço do Bem é incompatível com certos hábitos e com toda espécie de vícios. A mediunidade de cura carrega uma grande responsabilidade diante dos enfermos. O médium viciado, por meios que escapam até mesmo à sua sensibilidade, transfere para o doente o miasma oriundo dos vícios,aquele magnetismo inferior que representa uma doação imprestável.O cigarro, adotado por certos homens como distração, passa a dominá-los como necessidade e avança ainda mais, ficando na escala dos vícios. O homem, esse grande ser dotado de inteligência e razão,que domina todas as coisas, é dominado, dependendo, para viver, desse ato inferior para o qual arruma mil desculpas  sem fundamentos, que lhe permitam sustentar a sua inferioridade e desrespeitar os que não usam o fumo. O fumo não faz mal somente ao físico. Atinge, por meios sutis, outros corpos que o espírito usa. Não estamos combatendo nada, estamos apenas mostrando o que, por vezes, escapa ao entendimento de muitos. A intriga, muito comum nos meios humanos e que pertence a variadas escalas, perturba a função mediúnica, distorcendo as forças do bem, e impedindo que o fluido cósmico, na sua candidez, viaje por todos os centros de forças encravados no corpo espiritual com o seu seguro desempenho.O álcool em excesso, além de provocar ruptura em delicadas membranas protetoras que separam o mundo espiritual do mundo físico, desativa e retarda as vibrações do centro energético esplênico,interrompendo a distribuição de forças vitais a todo o organismo, impedindo as próprias glândulas endócrinas da fabricação adequada de hormônios, elementos indispensáveis à vida humana, além de outras responsabilidades que têm esses instrumentos louváveis do corpo humano. O centro de força esplênico irradia uma luz rosa encantadora no homem dotado de equilíbrio, que já aprendeu a cultivar as virtudes mencionadas pelo Evangelho de Jesus. Tais virtudes devem ser cultivadas pelo médium, consciente desses tesouros que Deus concedeu a todos. O desinteresse pelo Bem, principalmente da comunidade que o cerca, trava as pétalas de luz de alta velocidade do centro coronário -que, nos espíritos evoluídos, se manifestam com policromias indescritíveis - e este se escurece pelo que recebe da mente viciada e sem disposição para a caridade e o amor.O sexo em demasia, canalizado pela distorção da mente eivada de pensamentos inferiores, embrutece a área dos sentimentos, e o centro cardíaco, que no homem de bem desprende luzes de um amarelo mesclado com azul celeste, no sexualista exagerado passa a soltar um vermelho de cor destonante pela violência que recebeu dos impulsos inferiores.A maledicência e o humor picante são vícios terríveis que igualmente modificam todo o sistema de irrigação vital, que acompanham o grande rio sanguíneo, na sua manifestação de vida em todo o complexo humano. Não nos parece necessário falar mais dos desvios da mediunidade, pois pelo que já vimos, podes deduzir as conseqüências das outras no campo mediúnico. A iniquidade é campo fértil para a desarmonia, e a desarmonia é festa para as sombras. Se o companheiro ainda não tem forças para se libertar dos hábitos incômodos e dos vícios perniciosos, não intentes, por enquanto, desenvolver teus dons espirituais, porque uma coisa não pode se misturar à outra, para que não advenham terremotos internos e conflitos incompreensíveis. Todavia, para tudo existe solução e esta se encontra no trabalho da caridade, desde que não se exija nada em troca, pelo teu dever de ajudar aos teus irmãos carentes. Faze-te companheiro do bom livro, que ele te orienta, e torna-te amigo de homens que se entregaram à reforma moral, que eles vão ajudar-te nos primeiros passos na senda da verdade. Tudo o que procuras existe dentro de ti, até o próprio céu. Os vícios somente prendem e usam seu poder sobre os inferiores, que neles se deliciam das coisas transitórias, por desconhecerem as belezas eternas que as virtudes restabelecem nos corações. Se és médium curador, procura analisar a tua vida. Mas faze isso todos os dias e exige de ti mesmo uma mudança, se for o caso, aquela que obedece à lei da harmonia, mas que nunca pára de modificar para melhor. A missão da criatura que já se libertou das inferioridades morais é ajudar aos outros no silêncio dos exemplos, com o mesmo sorriso e a mesma dedicação dos discípulos do Mestre, quando chamados por Ele a servir de instrumentos de educação para a humanidade. Sê um deles na feição que te agrade trabalhar. Faze tudo com amor, que o amor tem a força de transportar todos os vícios, lançando-os para fora, e instalando a luz no seu mundo interno, para que viceje a verdadeira felicidade no centro de teu coração e nele nasça o Cristo, convidando-O para o banquete de luz, na luz de Deus. Longe de nós incentivar o fanatismo. Apenas procuramos irmãos de boa vontade para o equilíbrio das nossas forças espirituais, dominando os instintos animais que, porventura, queiram nos impedir na conquista da nossa liberdade. O médium que ainda não se esqueceu dos vícios, anda com passos largos para as casas de alienados mentais, onde vai aprender pela dor o que não se dispôs a conquistar pelo amor. Àquele que quer se renovar interiormente não lhe faltarão as mãos benfeitoras da espiritualidade maior, amparando-o em todos os seus esforços, como bênçãos de Deus e como misericórdia de Jesus aos filhos que pedem a melhoria não só com palavras, mas com os próprios esforços. Vamos dar-nos as mãos, espíritos e homens, com lealdade, para melhor compreendermos o Evangelho do Mestre e, nessa sintonia dos nossos corações com Ele, nada mais teremos a esperar, senão a luz.

Segurança Mediúnica – Miramez

Senhor, fazei de nós instrumentos da Vossa Paz